quarta-feira, 28 de maio de 2008

O embrulho - Por Emerson Batista

Passava um pouco das onze horas da noite quando ele virou aquela esquina mal iluminada. Entrou em uma das ruas mais sombrias daquele canto da cidade, distante apenas algumas quadras do metrô. Apertou o passo, sabia que tinha menos de uma hora para chegar à estação antes do último trem partir. Já fazia algum tempo que tinha a estranha sensação de estar sendo seguido.
Àquela hora da noite não se via viva alma na rua, pois ali não era um bairro muito freqüentado e muito menos indicado para se andar sozinho. Olhou para frente e até onde a escuridão lhe permitia enxergar, não havia nenhum local no qual poderia se refugiar. Durante o dia a rua era invadida por uma multidão de gente deslocando-se para outros pontos da cidade ou de encontro ao comércio local, o qual, àquela hora mostrava suas portas fechadas como se dos dois lados da rua existisse uma interminável parede suja e sem brilho. Durante a noite sobrava apenas a sujeira como testemunha da movimentação que ali existiu, um contraste com aquele momento.
Aumentou o passo, queria acabar logo com tudo aquilo, não agüentava mais. Dentro do embrulho em suas mãos a razão de sair àquela hora da noite. Estava ali de chinelos, uma camisa já surrada do Corinthians e uma bermuda estampada verde e laranja. Não tivera tempo de trocar a roupa. Apesar da temperatura agradável sentia frio, causado mais pela inquietação que experimentava. Suas pernas começaram a tremer; não conseguia olhar para trás, seu coração parecia estar prestes a explodir.
O medo leva ao desespero e aquele homem estava desesperado. Primeiro pela necessidade do que tinha a fazer, não sabia se daria tempo. Depois, sentia o perigo se aproximando. Agora estava quase correndo e o chinelo dificultava os seus passos, ao longe já podia vislumbrar as luzes da estação.
Às onze horas e quarenta e nove minutos descia correndo as escadas de acesso à plataforma, nada aliviado, mas um pouco menos desesperado, lutava agora consigo mesmo. Entrou no vagão e permaneceu em pé à frente da porta, afinal era apenas uma estação. Começou a suar, estava bem próximo agora.
Após sair do Metrô e passar pelas duas ruas antecedentes à sua, correndo tanto quanto podia, virou a última esquina e já sem um dos chinelos parou em frente ao seu portão. Entrou. Passou pela sala derrubando a mesinha de centro. Naquele momento só pensava em uma coisa: o vaso sanitário. Do embrulho em suas mãos retirou o papel higiênico, mal teve tempo de se desfazer da bermuda verde e laranja.
Totalmente aliviado e nenhum pouco desesperado pensava, ainda sentado, se havia fechado as portas ao entrar, quando ao olhar para a janela à sua direita, com um sobressalto pode visualizar, um rolo de papel higiênico ainda intacto.