quinta-feira, 16 de agosto de 2012

No pódio do amadorismo - por José Cruz




"Fora do campo das competições há outro universo de emoções no esporte: as milionárias fontes de financiamento, a maioria de origem governamental, mas com aplicações nem sempre transparentes e, por isso, motivos de frequentes investigações". (José Cruz)

Ainda falando de Olimpíada; escrevi na postagem anterior que era necessário enumerar todos os problemas e dificuldades encontrados no caminho que leva ao pódio olímpico. O Jornalista José Cruz o fez com muita propriedade. José Cruz cobre as áreas de política, economia e legislação do esporte.


O Brasil esportivo, mesmo com recordes de medalhas, deixa os Jogos de Londres reprovado no vestibular do pódio olímpico. E a principal derrota não é dos atletas, mas do governo federal, que fracassou na política de financiar o alto rendimento a partir de 2003, ignorando os elementares investimentos na iniciação e no desporto escolar.
Temos espetaculares 33 milhões de estudantes, mas é potencial ainda desprezado devido à falta de projetos a partir da prática de educação física, ponto de partida para criar nos jovens a cultura do esporte. Mesmo assim, houve investimentos: R$ 2 bilhões no último ciclo olímpico, mas no alto rendimento. Foi o dobro do aplicado na delegação enviada aos Jogos de Pequim, em 2008.
Em 2016, o Rio de Janeiro receberá a histórica Olimpíada. Mas, amadoristicamente, a sexta economia mundial ainda convive com a incerteza sobre os rumos para tornar o Brasil país olímpico. E isso é grave, não só sob a perspectiva de conquistas de pódios como de desperdícios públicos. Porque uma coisa são os jogos, as disputas; outra são os negócios do esporte. Nesse binômio também patinamos. Pelo sistema adotado, o Estado financia os custos da festa, e a iniciativa privada contabiliza o lucro. Assim como no Pan-Americano de 2007, a disputa político-institucional é desequilibrada e onera o cofre público.
A partir de 2003, o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, fez a opção por investir no esporte. Criou um ministério específico e turbinou orçamentos. Sancionou a Lei de Incentivo ao Esporte, a Bolsa Atleta, determinou que as oito estatais — Banco do Brasil, Caixa, Petrobras, Infraero, Casa da Moeda, Correios, Eletrobras e BNDES — aumentassem o patrocínio para 22 modalidades. Além disso, pagou a conta maior dos Jogos Pan-Americanos, com custo total de R$ 3,4 bilhões, cujo legado ficou no projeto.
Mesmo com investimentos bilionários, o governo não fez o elementar entrosamento entre as pastas da Educação, Esporte e Saúde; não dotou as escolas de quadras esportivas nem aparelhou as instalações existentes; ignorou a valorização dos professores, ponto de partida para a elementar prática da educação física escolar.
Os tradicionais Jogos Escolares e Universitários, que em outros tempos eram fonte de identificação de talentos, saíram da área federal e passaram à competência do Comitê Olímpico. Sem vínculo pedagógico ou compromisso de governo, tornaram-se eventos de calendário, apenas.
É nesse contexto de fartura financeira e escassez de programas que repercute o desempenho brasileiro nos Jogos de Londres. Sem exageros, a  colocação do país no quadro de medalhas não surpreende. O próprio presidente do Comitê Olímpico, Carlos Nuzman, fez previsão ao afirmar que nos igualaríamos à Olimpíada de Pequim, quando ganhamos 15 medalhas.
Como em Jogos anteriores, as apostas de pódios ficaram concentradas em nomes ou equipes tradicionais. E, se esses falhassem, crescia a pressão sobre os demais atletas. E tais apostas não levavam em consideração que outros países também se desenvolveram e preparam as delegações. A Coreia do Sul é o principal exemplo.
Houve novidades, como a evolução feminina no judô, pódio no boxe e, principalmente, o ouro de Arthur Zanetti, nas argolas. Mas nenhum desses resultados está vinculado a uma política de governo, o que agrava o quadro para 2016. Afinal, o que significa o futebol no contexto olímpico brasileiro? Para o evento no Rio de Janeiro, a difícil meta é colocar o Brasil entre os 10 primeiros do ranking mundial.
As medidas para chegar a essa difícil meta estão atrasadas. Porém o governo precisa fixar, antes, um perfil hierárquico na desordem institucional em que se confundem as competências do Ministério do Esporte e do Comitê Olímpico.
Afinal, o Estado deve se envolver com o esporte de rendimento ou isso é competência da iniciativa privada? Dinheiro público deve contemplar atletas ou ser destinado ao desporto escolar, prioritariamente, como determina a Constituição Federal?
Os Jogos, enfim, provocam emoções, incentivam o patriotismo e movimentam a economia. Mas o Brasil olímpico ainda está no pódio do amadorismo.

Um comentário:

leandro d. bap. sant. disse...

uau, me gustou mucho.. assino embaixo.. Digo que não há atalhos para se chegar nos resultados.. investir em atletas de ponta é atalho, fico triste em ouvir um vizinho e amigo americano que disse: nos estados unidos todo dinheiro vai pra base!!!Mas esperançoso de que um dia isto mude :)